Por ocasião da dedicação da Igreja Matriz do Sagrado Coração de Jesus, em Mariana, aproveito a oportunidade para falar sobre a importância do ESPAÇO LITÚRGICO.
Após a ressurreição de Jesus todo o espaço foi inundado pela vida em Cristo tornando-se sacramento da definitiva morada prometida por Deus. Jesus Cristo é o novo espaço aberto, sendo nossas Igrejas, lugar de celebração, de memória de sua presença. A comunidade para celebrar necessita de um espaço, um lugar no qual possa se reunir. De inicio a celebração se dava nas casas particulares. Como as comunidades cresciam, foi necessário organizar casas reservadas para a comunidade se reunir, a “domus eclesiae”.
Os primeiros cristãos de Roma logo não aceitaram o termo “Templo” já que é a comunidade o Templo do Espírito Santo. Dessa forma o espaço passou a receber o nome de Igreja, que é a finalidade do Edifício. O termo Igreja quer dizer “convocação”, a comunidade dos convocados, que celebram o acontecimento do Cristo. Fica claro então que o Edifício, a Igreja deve ser o lugar da Teofania, do encontro e manifestação de Deus. No momento em que a comunidade se reúne como Igreja, realiza a experiência do Deus Conosco, se torna clara a finalidade do Espaço Litúrgico: pelos Sacramentos e sacramentais Deus se manifesta e a Comunidade renova sua fé.
Segundo o renomado professor e artista sacro Cláudio Pastro “Toda a construção cristã e o que ali se celebra se espelha no livro do Apocalípse, capítulo 21 e 22: A Nova Jerusalém – a cidade do alto. É o lugar da presença, da manifestação e da revelação. O lugar pedagógico e da aliança: da assembléia convocada = Igreja; da oração (escuta da Palavra e do louvor); da aula magna = Palavra Viva-Hoje da memória Pascal; do Enlace e do convívio da Esposa com o seu Senhor; do Banquete do Cordeiro (sacrifício e ceia); do repouso; da adoração (em Espírito e verdade).” Isto nos faz refletir sobre muitas igrejas arquitetônicas, gestos, vestes, músicas, relações do faz de conta, que são mais contra-testemunho (sinais dyabolos) do que sinais de unidade.
A liturgista e arquiteta, Regina Celi de Albuquerque Machado, aponta alguns critérios para a organização do espaço Litúrgico (transcrevo aqui apenas algumas conclusões da exposição realizada no Encontro de Arte na Liturgia organizado pela CNBB): “Construir representa uma decisão muito séria, construir a casa do Povo de Deus é mais séria ainda. É a existência de uma comunidade de irmãos que está comprometida. Construir é fazer a experiência da criação. É um novo começo, uma nova vida, a criação de um mundo novo. Um mundo de fraternidade e liberdade, de comunhão e de graça, de recolhimento e de silêncio, de antecipação de uma realidade sonhada.
Construir ou organizar um lugar para abrigar uma comunidade com práticas litúrgicas é muito mais que levantar paredes e mobilizar o espaço. O espaço litúrgico precisa atender dois objetivos: ser funcional para as práticas que nele serão desenvolvidas e ser sinal do mistério de Deus, de Cristo e da Igreja. As pessoas envolvidas na construção devem conhecer a teologia do templo e a fé que anima aquela comunidade.
A maioria das nossas comunidades são pobres. Mais uma razão para que o pouco dinheiro que possuem, conseguido a duras penas, seja utilizado da melhor forma possível.
Não é porque se é pobre, o dinheiro curto, que se deve fazer um local para a celebração sem nenhuma técnica e sem nenhuma mística. O pobre, mais do que qualquer um, tem direito ao belo, que é Dom de Deus e está tão ausente da sua dura realidade.
O belo não está associado ao luxo. A arte é capaz de valorizar a matéria mais pobre e sublimar a forma mais simples. A simplicidade é o caminho mais fácil para atingir o belo e o sublime. Não é preciso encher o lugar da celebração com muita coisa, muita decoração, muito simbolismo. O espaço da assembléia, a mesa da Eucaristia, a mesa da palavra, o lugar da presidência e a liturgia já são carregados de simbolismo e bastam por si só.
Um lugar muito cheio de coisas tende a esvaziar a alma humana. O vazio, pelo contrário, tende a se encher pelo Espírito.
A construção de um local para a celebração só faz sentido se for feito por e para uma comunidade de fé concreta. O que vai sendo construída materialmente com tijolos estará sendo construído também no íntimo da comunidade.
A casa de Deus deve ser expressão da verdade que ela anuncia, sem falsidade, nem limitações. Os materiais devem ser puros e verdadeiros, nada de plástico, fórmica ou imitações de pedra e madeira. Nada deve ser associado ao descartável ou da sociedade de consumo.
A arquiteta, do Apostolado Litúrgico, Ms. Irmã Laíde Sonda, a convite de Dom Geraldo Lyrio Rocha fez o projeto modificando planta original de nossa Matriz, em sua visita nos orientou: “Hoje em dia se dá muita importância à decoração, ao acabamento das casas etc. Na Igreja, a “casa da Igreja”, também é preciso criar unidade, pensar no acabamento, apesar de existir uma diferença grande entre a casa individual e a casa da comunidade. O padre Cocagnac diz que decoração significa “glória”, algo intrínseco ao espaço e não um acréscimo, uma adereço posterior. Não se faz a Igreja para depois pensar nas peças. As peças e a sua colocação geram o espaço.
Outro aspecto é a questão iconográfica, simbólica do espaço. A Igreja é sinal, símbolo da Nova Jerusalém, do espaço transfigurado, da paz, da harmonia, da esposa vestida em trajes de festa para as núpcias. É um espaço cujo centro é o Cristo, o Cordeiro, presente no seu corpo, a comunidade, na palavra, na presidência, no pão e no vinho, na mesa preparada para o banquete.
Lembro um arquiteto austríaco que diz, em relação ao espaço sagrado: “A pobreza (entendida como limpeza, nobreza) é como o nada, causa náusea ao existencialismo e embriaguez divina ao místico”. Também o liturgista Romano Guardini afirma: “A falta de imagens no espaço celebrativo é em si mesma uma imagem.”
Deus precisa do vazio, do silêncio para se comunicar. Estamos atordoados por mil e uma imagens que a mídia dia após dia nos oferece. Quando as apresentarmos no espaço de celebração sejam pregnantes, plenas de verdade e, portanto, “imagens” de algo que as transcende, que está além do que elas representam.... manifestação do Mistério.
O Espaço deve transparecer Cristo presente na Comunidade reunida, na Pessoa de quem preside, na Palavra proclamada, nos Sinais sacramentais, na Mesa. Os elementos que manifestam esta presença devem formar um conjunto harmônico. A unidade se manifesta na matéria usada, nas cores, no design das peças.”
Segundo o artista e professor Cláudio Pastro “Na beleza das orações, da música, do culto, das paredes, o homem reconhece a grandeza do Celeste e constrói o humano. Ao longo da história desses 2000 anos de cristianismo, a arte nas Igrejas sempre foi a da “Bíblia Pauperum”. No lugar da celebração, a Escritura torna-se viva e o cristão pode namorar sua História da Salvação. E assim, pouco a pouco, ser formado, compreende figurativamente, que é parte de um povo, de um corpo mais amplo que sua pobre comunidade. Contemplando a nobreza dos gestos, as cores e os sons, se é convidado a repeti-los em comunidade e em sociedade passa-se do contemplado ao vivido”.
Do exposto fica claro que o espaço arquitetônico da Igreja é o reflexo da unidade da celebração, testemunha do invisível que é o próprio Deus. Testemunho e anúncio de nosso principal tesouro: Jesus Cristo. Sua disposição também Evangeliza. Para compreender seu significado, é preciso penetrar profundamente seu sentido.
Pe. Luiz Claudio Vieira - Mariana - MG
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